INTELIGÊNCIA ARTIFICIAL EM NOVA CHAVE

Glauco Arbix, de São Petersburgo

Nos Estados Unidos, as pesquisas sobre inteligência artificial (IA) vêm de longe. Mas aceleraram de modo extraordinário nos últimos cinco anos, por conta da velocidade dos computadores, do aumento de sua capacidade de armazenamento, da queda de seu custo e, principalmente pela sofisticação de sua pesquisa. Os avanços atuais ocorrem nas universidades, em empresas de alta tecnologia como o Facebook, Amazon, Apple, Google, IBM, mas também em empresas industriais, como a Tesla e Nvidea.

Em sintonia com essa trajetória, o Conselho de Estado chinês anunciou em julho seus planos para fazer da China o principal centro de Inteligência Artificial em 2030. Empresas como a Baidu, Alibaba e Tencent, que já tinham foco em IA, serão agora mais incentivadas e vitaminadas pelo Estado.

Na mesma linha, a Rússia revelou suas intenções com a IA em setembro. O presidente Vladimir Putin afirmou que a “inteligência artificial é o futuro, não só da Rússia, mas também da humanidade”. E cravou as intenções do estado russo de se destacar na disputa nesse campo do conhecimento, tido como pré-condição para comandar o mundo.

O ponto central é que as novidades ligadas a IA atingem as pessoas diariamente, com dispositivos cada vez mais precisos de reconhecimento de imagens, voz, de face, de tradução, de captação de tendências e até mesmo de identificação do gosto de cada um. Áreas como a saúde, transporte, varejo, bancos, energia, manufatura e agricultura já vem sendo desestabilizadas por muitos desses avanços, que prenunciam tempos difíceis para aqueles que insistem em permanecer céticos em relação ao potencial da IA. Empresas de todo tipo e porte, instituições como as universidades e os governos estão instados a se envolver na geração e ampliação desse corpo de conhecimento. Principalmente porque há questões de fundo ligadas à IA que não encontram resposta fácil. Questões caras a qualquer sociedade, já que envolvem transformações na economia, em valores éticos, legais, regulatórios, além de incidirem fortemente sobre pobreza, desigualdade, privacidade, emprego e renda. Para não citar a educação, calcanhar de Aquiles do nosso país e fundamental para a imensa maioria dos trabalhadores.

Com essas preocupações, aqui de São Petersburgo vejo o professor Alexi Samsonovich do Departamento de Cibernética do Instituto de Engenharia e Física de Moscou, declarar que os pesquisadores russos estão no limite de anunciar um “major breakthrough” em IA.

Os ares são de segredo, mas o tema de máquinas emocionalmente inteligentes frequentam as conversas. Samsonovich já havia feito anúncio semelhante em Nova Iorque, há algumas semanas. O que se sabe é que ele e sua equipe desenvolvem atualmente um Ator Virtual, que seria capaz de planejar, fixar objetivos e apresentar caminhos para ampliar a relação entre as pessoas. A ver. Pois os resultados podem se mostrar como mais uma promessa não cumprida da IA.

O instigante, porém, é a disposição existente para enfrentar desafios ambiciosos, o que é fonte de energia e de atração de uma legião de jovens pesquisadores que passam a trabalhar com os olhos no futuro.

Como brasileiro, confesso que sinto um pouco de inveja desse entusiasmo. O Brasil poderia fazer muito mais nesses domínios com a qualificação de seus pesquisadores. Nos tempos de hoje nosso país se perde e atira no próprio pé com os cortes indiscriminados em Ciência, Tecnologia e Inovação, como vem ocorrendo. É uma pena. Como na época do boom da microeletrônica, o Brasil corre o risco de perder mais uma grande oportunidade de dar um salto.

Minha universidade, a USP, com certeza poderia concentrar esforços e reunir pesquisadores e pesquisadoras das engenharias, da matemática, física, de todas as humanidades na construção de um grande polo de Inteligência Artificial, fundamental para animar redes no Brasil e no exterior.

Seria bom se os candidatos a reitor da USP, em meio ao processo eleitoral que culminará com a eleição no final deste mês, pelo menos piscassem como sinal de simpatia pelo tema. É a forma concreta de se batalhar pela valoração da pesquisa, sem se perder nos meandros da ideologia, como o meio mais eficaz de se colocar a USP no mesmo nível que as grandes universidades do mundo.

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