AS PEDRAS NO CAMINHO DO CARRO AUTÔNOMO

Por 22 de agosto de 2016

Glauco Arbix*

Em maio passado uma colisão tirou a vida do motorista de um carro elétrico Tesla, de última geração, nos Estados Unidos. O motorista utilizava um recurso opcional denominado Autopilot, sistema similar a um controle avançado de viagem, capaz de detectar obstáculos, mudar de faixa e brecar quando necessário. A Tesla não fabrica carros autônomos e o Autopilot não elimina a responsabilidade do motorista, que deve comandar o sistema e estar pronto para assumir o controle do veículo a qualquer momento.

Mesmo com essas advertências e com as investigações do ministério dos Transportes ainda em andamento, o trágico acidente esquentou o debate sobre os carros autônomos que hoje desenvolvem testes nas estradas nos Estados Unidos e Europa.

A possibilidade de falha do automóvel atualizou questões espinhosas, que ultrapassam o universo da tecnologia e exigem reflexão sobre temas éticos e morais. Mesmo com a perspectiva de forte diminuição de acidentes e das inúmeras vantagens oferecidas pelos veículos autônomos (ver artigo Futuro à Vista), a possibilidade de erros e acidentes coloca perguntas praticamente inescapáveis:

Quem foi o culpado? Ou mesmo, quem será o culpado de um acidente com um carro sem motorista? Os testes atuais estão acelerados demais? As versões Beta que inúmeras empresas colocaram em movimento estão preparadas para enfrentar as variações imprevisíveis do trânsito nas estradas? E nas cidades, em que a confusão é ainda maior?

Será que as regras estabelecidas para testes são suficientes? Servirão de base para sistemas regulatórios seguros num futuro próximo? Como elaborar um corpo legal que efetivamente proteja as pessoas? Qual será o nível de risco que as sociedades estariam dispostas a aceitar? E o quê seria exatamente um “risco aceitável”, quando pode estar em jogo a vida das pessoas?
O razoável para todos seria supor que esses carros serão à prova de falhas. Mas essa expectativa seria razoável?
De fato, a questão da confiança é crítica para a adoção das tecnologias que sustentam o carro sem-motorista que, se dúvida, surge como um alienígena na civilização do automóvel consolidada no século passado.

A história do automóvel mostra que as tecnologias de segurança evoluíram lentamente a partir de experiências muitas vezes dramáticas e doloridas. Porém, a tolerância em relação a um robô que promete invadir nosso cotidiano certamente tem qualidade distinta.

E se a confiança for abalada, a resistência e mesmo a descontinuidade dessas tecnologias serão realidades.
O que coloca enorme responsabilidade sobre os ombros das empresas e das autoridades reguladoras, que precisam estar efetivamente preparadas para situações dessa natureza.

No Brasil, em outubro de 2013, pesquisadores da USP, do Instituto de Ciências Matemáticas e da Computação e da Escola de Engenharia, conseguiram adaptar um Fiat Palio que passeou pelas ruas de São Carlos (interior paulista).

O projeto Carro Robótico Inteligente para Navegação Autônoma (Carina), financiado pela Fapesp e CNPq se baseia na possibilidade de que os carros, se preparados adequadamente, podem trocar informações automaticamente, via sistema de sensores. Esse é o futuro desenhado para as cidades inteligentes, em que veículos articulados em rede teriam condições de serem utilizados com maior segurança e velocidade.

Além da USP, grupos de pesquisa da Universidade Federal do Espírito Santo (UFES, Laboratório de Computação de Alto Desempenho) e de Minas Gerais (UFMG) também mantêm projetos de carros sem motorista, todos em cooperação com universidades de fora do país.

Apesar das polêmicas levantadas neste artigo, os consumidores estão pagando adiantado por novos modelos da Tesla. E isso para ficar na lista de espera por mais de 1 ano. Veja neste vídeo como funciona o Autopilot

*Professor Titular da USP, pesquisador do Observatório da Inovação e ex-presidente da Finep

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