O TRABALHO NA ENCRUZILHADA

Por 19 de setembro de 2016

Glauco Arbix
Lucas Carvalho

No ano de 1900, 41% dos postos de trabalho nos Estados Unidos estavam na agricultura. Em 2000, migraram para as cidades e o emprego no campo caiu para 2%. Mecanização e industrialização nos meios urbanos contribuíram para a explosão do trabalho nas fábricas e centros urbanos. Mais recentemente, com as novas tecnologias, o trabalho industrial diminui constantemente enquanto crescem os empregos em serviços. Apesar dessas transformações profundas no mercado de trabalho norte-americano, as taxas de desemprego se equilibraram, graças às compensações oferecidas com o surgimento de empregos em novas atividades industriais e nos serviços.

O drama de hoje é que os números nem sempre confirmam esses mecanismos de compensação, que marcaram as fases anteriores da industrialização. Os novos setores tecnológicos que surgem não estão promovendo as mesmas oportunidades de trabalho em números absolutos, especialmente para os trabalhadores menos qualificados.

Na indústria de entretenimento, de música e filmes, a ascensão do iTunes, Spotify e Pandora, levou empresas tradicionais do mercado musical americano (como HMV, FYE, Sam Goody e Tower Records) ao colapso. A Blockbuster Entertainment, que chegou a empregar 60.000 pessoas em 2004, decretou falência em 2013 após o crescimento da Netflix. As pesquisas ainda não são conclusivas, mas há sinais de que as novas empresas intensivas em tecnologia empregam muito menos do que suas antigas rivais, sendo que não há nas áreas novas indícios de geração de empregos em patamares semelhantes. Pelo menos por enquanto.

De onde surgirão as novas oportunidades de trabalho? Como serão os empregos do futuro? As pesquisas indicam que as carreiras mais ligadas à tecnologia da informação são as que apresentam maiores índices de crescimento. O emprego gerado ocorre com a rápida expansão de aplicações como a Internet das Coisas, automação, big data e inteligência artificial. Além do emprego, esses novos domínios abrem oportunidades para pequenas e médias empresas, ou mesmo para serviços autônomos, o que pode levar à criação de novos empregos.

E o que acontece em outros setores? Dois pesquisadores, Autor e Price, identificaram que as tarefas não rotineiras, aquelas que envolvem capacidade de análise, conhecimentos específicos e habilidades de comunicação mais complexas, aumentaram entre os trabalhadores americanos desde 1960, enquanto que as tarefas manuais, as rotineiras, começaram a declinar entre os anos 1970 e 1980, acompanhando a introdução das novas tecnologias.

GráficoEm paralelo, Geoff Colvin, em seu livro Humans are Underrated, argumenta que a propensão inata para a interação social, comunicação e empatia é o que faz os humanos tão especiais, ou seja, possuem características que as máquinas jamais poderão substituir. Para este autor, as inovações podem reduzir o volume de trabalhos rotineiros em um futuro próximo, mas esse movimento não significa exatamente que o mercado de trabalho não conseguirá absorver seu impacto.

As teses são conflitantes e, até o momento, não há estudos conclusivos a respeito. Ou seja, só o tempo vai mostrar se prevalecerá o mesmo padrão anterior, que marcou o século passado, em que a economia, ao se dinamizar, fechava postos de trabalho, mas abria novos, em setores mais avançados. Para o bem das nossas sociedades, é melhor a gente pensar assim. Mas, por prudência, é bom também acompanhar a movimentação do mercado de trabalho, para não ser assombrado por surpresas desagradáveis.

A crise que atinge a economia brasileira mistura esses movimentos, dificultando a visualização de movimentos mais estruturais. Porém, dados os sinais de outras economias, em que o novo emprego é muito mais seletivo e orientado para os mais qualificados, é bom que o Brasil se prepare para enfrentar mudanças profundas na configuração do mundo do trabalho. Mudanças em nosso sistema educacional, necessárias antes, tornam-se dramáticas hoje. Sem foco e prioridades na educação, deixamos de acompanhar e nos adaptar às transformações do mundo do trabalho. O que tornará a vida de quem procura emprego um pequeno inferno, já que serão levados a competir com as novas tecnologias ao invés de trabalhar com elas.

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