INTELIGÊNCIA ARTIFICIAL NO COMBATE À POBREZA

Lucas Carvalho – Pesquisador USP-Cebrap

Realizar pesquisas de grandes proporções e que forneçam dados para medição de aspectos socioeconômicos, como a PNAD (Pesquisa Nacional de Amostra por Domicílios) e a POF (Pesquisa de Orçamentos Familiares), exigem tempo e investimentos milionários. Em épocas de restrições financeiras, como a atual, algumas pesquisas deixam até mesmo de serem feitas, como anunciou o IBGE quanto ao Censo Agropecuário de 2017. Se esse tipo de problema ocorre no Brasil, cuja estrutura de pesquisas é consolidada, imagine o quão difícil pode ser obter informações estatísticas em países pouco desenvolvidos, nos quais fatores como custo, tempo, segurança ou até mesmo a omissão proposital dos governos desenham a realidade.

Mas um recente estudo realizado por uma equipe da Universidade de Stanford, Califórnia, utilizando imagens de satélite pretende mudar essa situação. Seu objetivo é oferecer uma alternativa para o mapeamento da pobreza. A equipe de Marshal Burke, composta por cientistas sociais e especialistas em computação, teve a ideia de utilizar as câmeras de alta potência dos satélites para detectar a pobreza através da análise das suas imagens. O estudo se concentrou em cinco países africanos (Nigéria, Tanzânia, Uganda, Malawi e Ruanda) que possuem grande parte da população vivendo em situação de absoluta pobreza. E um acurado levantamento de dados que pudesse comprovar as previsões que fossem geradas.

As primeiras tentativas contaram com imagens do planeta durante a noite, buscando auferir aonde vivem os ricos e os pobres a partir do brilho das luzes elétricas que produzem um mapa brilhante de infraestrutura de cada região do planeta. No entanto, os pesquisadores notaram que à noite o subdesenvolvimento econômico moderado não parece muito diferente de pobreza absoluta, definida pelo Banco Mundial pelo poder aquisitivo de até US$ 1,90 por dia. A equipe de Burke passou então a buscar imagens diurnas dessas regiões, que também mostravam diferenças sutis entre as regiões de pobreza absoluta e moderada. Mas as imagens diurnas incluíam outros indicadores-chave, tais como a distância da fonte de água mais próxima ou do mercado urbano mais próximo, ou então onde estavam os campos agrícolas.

Tomar conclusões a partir de indicadores tão sutis pode ir além até mesmo da capacidade de um especialista, o que talvez não seja tão difícil para um computador treinado. Para tanto, a estratégia desses pesquisadores foi criar algoritmos que conseguissem, por meio de técnicas de inteligência artificial, predizer com precisão os locais que apresentam pobreza absoluta e suas diferentes nuances. De acordo com os pesquisadores, em comparação com as imagens noturnas, as imagens diurnas se demonstraram 81% mais precisas na previsão em lugares com a linha de pobreza absoluta e 99% mais precisas em áreas onde os rendimentos são ainda mais baixos.

A novidade trazida pelo estudo anuncia não apenas uma nova e surpreendente técnica de levantamento de dados socioeconômicos, como também cria muitas possibilidades, mais eficientes e poderosas, para diferentes estudos e levantamentos de dados. Outros caminhos podem surgir, inclusive, para profissionais e pesquisadores das mais diversas áreas, assim como podem contribuir para que ações políticas se tornem mais precisas e acertadas.

Leia o estudo

lucas.monteiro.carvalho@usp.br

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